top of page

O Origami e a sua História

Atualizado: 2 de ago. de 2024

Joaquim Reis

(artigo publicado em Janeiro de 2008 na revista da Sociedade Portuguesa de Naturalogia)

Introdução


Origami é uma arte de dobragem de papel. Apesar de "origami" ser uma palavra japonesa (ela deriva das palavras japonesas "ori" e "kami", que significam "dobrar" e "papel", respectivamente), existe uma tradição desta arte também na Europa, e não apenas no Japão.


Não é raro ser dada uma ideia muito limitada desta arte da dobragem de papel, mostrando-a como sendo um passatempo infantil de construir de pássaros, aviões, bombas de água e adivinhos em papel dobrado. Na realidade trata-se de uma arte muito antiga e que continua a evoluir na actualidade.


Na arte de origami assume-se, em geral, que a realização de um modelo de origami usa papel, ou um material com propriedades semelhantes (como pano, folha ou chapa metálica), parte de uma folha única com forma quadrada e não emprega qualquer tipo de corte ou colagem para obter um modelo acabado de peça unitária, bidimensional ou tridimensional. Outras artes, ou variantes similares desta arte são, por exemplo, o origami modular (origami composto por ligações por encaixe de mais de um origami unitário), o kirigami (recorte, ou dobragem e recorte, de papel) e a escultura em papel genérica (em geral tridimensional e envolvendo técnicas adicionais, como fixação com cola, agrafos, ou outro meio, ou outras) [Temko 2006].


Supõe-se que a arte da dobragem de papel, ou origami, é tão antiga como a invenção do papel. Esta deve ter ocorrido na China há não menos de cerca de 2000 anos. O fabrico do papel manteve-se em segredo até os chineses terem invadido a Coreia e o Japão, no princípio do século VII. Depois disso difundiu-se, tendo-se também espalhado pela Ásia e pelo Médio Oriente e tendo-se propagado para o Ocidente, devendo ter chegado à Europa por meados do século XII. Os japoneses refinaram o processo de fabrico de papel e tornaram-no uma parte da vida diária [Jackson 1999].


O Origami Clássico Japonês


O origami acabou fazendo parte da cultura japonesa e, do século VIII ao século XII (durante o

período Heian), tomava já parte significativa em cerimónias da nobreza. O origami era, frequentemente, uma forma de embrulho de cerimónia [Beech 2005], [Cantz 2005]. Por exemplo, havia o costume de os guerreiros samurais trocarem presentes embrulhados de boa sorte, designados por noshi. Os diplomas dos mestres da cerimónia de chá eram dobrados de forma a permanecerem secretos, sendo que, uma vez abertos, não mais poderiam ser fechados sem deixar vincos adicionais, ou seja, vestígios que denunciariam a abertura. Havia também uma espécie de embrulho para as garrafas de sake. Também, os nobres Xintoístas celebravam casamentos com copos de vidro decorados com borboletas fêmea e borboletas macho feitas de papel, que representavam a noiva e o noivo.


Do século XIV ao século XVI (durante o período Muromachi), com a vulgarização do papel, o origami assume, no Japão, um outro aspecto cerimonial, em que diferentes estilos de origami servem para distinguir classes sociais diferentes de samurais aristocratas. Posteriormente, durante os séculos de XVII a XIX (no período Tokugawa), que envolveu um florescimento da cultura e arte japonesas, o origami teve uma grande difusão. Aqui surgiu um novo tipo de origami, o origami figurativo, ou recreativo, no qual se incluem vários origamis conhecidos, como por exemplo, o pássaro, ou grou (em japonês, orizuru), bem como o que hoje é apelidado a base do pássaro [Beech 2005], [Cantz 2005]. Muitos estão gravados em madeira ou desenhados em livros desde o século XVIII. Havia, então, origamis bastante sofisticados, cuja complexidade deixava fascinados os adultos, mais do que as crianças.


Os modelos de origami mais antigos conhecidos remontam a uma data incerta mas, por certo, anterior ao século X no Japão. Vários deles chegaram até à nossa era e foram importantes para o estabelecimento do vocabulário básico da arte do origami nos tempos modernos, devendo ser esta uma razão pela qual no Ocidente se adoptou a palavra "origami" em vez de "dobragem de papel".


O Origami Clássico Europeu


No século VIII os Mouros invadiram a Península Ibérica e levaram para Espanha com eles a dobragem de papel. Aqueles povos eram excelentes com a matemática e a astronomia e pensa-se que a teoria da dobragem do papel era usada como um apoio ao ensino dos princípios da geometria. Embora os Mouros tenham sido posteriormente expulsos da Península Ibérica, a tradição da dobragem de papel manteve-se até ao presente, tendo sido, nomeadamente, praticada e documentada pelo filósofo e poeta espanhol Miguel Unamuno (século XX).

Origamis clássicos tradicionais europeus são, por exemplo, a pajarita (papagaio) em Espanha, a cocotte (galinha) em França e os origamis de cavalos e cavaleiros do século XIX hoje conservados em museus alemães (em Nuremberga e em Dresden). O certificado baptismal alemão dos séculos XVI e XVII é outro exemplo, que corresponde à base de origami que hoje é apelidada base blintz [Cantz 2005].


O origami clássico europeu está bem documentado no contexto do ensino de crianças e isso foi devido a Friederich Froebel, que estabeleceu a primeira escola infantil, no meio do século XIX, incluindo no programa de ensino as dobragens de papel [Cantz 2005]. Talvez também por essa razão, no Ocidente, modernamente, durante muito tempo, a dobragem de papel foi vista como pouco mais de um passatempo para crianças da escola, que se divertiam com pássaros, rãs, chapéus, bombas de água, barcos e dardos (mais tarde aviões) de papel. Contudo, mais recentemente, muitos entusiastas da dobragem de papel acabaram reconhecendo o origami como um desafio intelectual e um exercício de criatividade.


O Origami Tradicional e o Origami Moderno


Segundo Koshiro Hatori (ver [Cantz 2005]) a dobragem de papel japonesa e europeia permaneceram independentes até meio do século XIX, sendo bem diferentes (por exemplo, os modelos de origami clássicos europeus baseiam-se em vincos a 45º, ao passo que os japoneses são tipicamente de 22,5º). A partir daí houve um movimento de intercâmbio entre a Europa e o Japão que produziu uma mistura entre o origami europeu e o origami japonês, originando um reportório que evoluiu e formou o núcleo do origami tradicional.


Ainda segundo Koshiro Hatori, deu-se um segundo movimento de intercâmbio a partir do meio do século XX, que tornou mais popular a arte do origami, e deu origem ao que chama origami Moderno. Este é caracterizado pela autoria (propriedade intelectual de criadores) de origami (o que não acontecia com origami tradicional, de autor anónimo), por ver o origami com um desafio intelectual (um puzzle), pela publicação de trabalhos de origamis de europeus, americanos e japoneses em inglês e em japonês, pela fundação de organizações centradas no origami (como, por exemplo, a British Origami Society, fundada em 1967), pela uniformização da notação empregue nos diagramas de representação de origamis (criada pelo engenheiro japonês Akira Yoshizawa, um dos líderes do origami criativo moderno, nos anos 1950 e 1960 e o introdutor das dobragens suaves e da dobragem curva com papel húmido).


O Origami Matemático e Computacional


O método de concepção moderno de origamis depende de algumas bases de origami existentes. Uma base de origami (por exemplo, a base do pássaro, a base da rã, a base blintz) é um origami numa fase intermédia, um patamar numa sequência de dobragens, que pode servir como ponto de partida para produzir certos modelos acabados de origamis.


A partir dos anos 1980, devido aos trabalhos independentes de um japonês e um ocidental (Jun Maekawa e Peter Engel, respectivamente) que estudaram os aspectos geométricos das bases, descobriu-se como inventar novas bases, abrindo caminho para a composição de origamis complexos. Essencialmente, o método consiste no rearranjo dos padrões de vincos (triângulos, rectângulos) na folha de uma base existente desmontada para obtenção de uma nova base, que permitirá obter modelos de origami diferentes. No essencial isto permitiu um processo, igual ao da engenharia, em que se podem conceber e projectar novos modelos de origamis antes de executar as suas dobragens para os produzir. Estes métodos matemáticos foram ainda mais desenvolvidos e culminaram no desenvolvimento de algoritmos que permitem automatizar computacionalmente aquele processo (por exemplo, o programa TreeMaker, de Robert Lang, um dos cientistas envolvidos nesta tendência matemática do origami).


O Origami Artístico


Outro aspecto, além do de puzzle geométrico (a que a vertente de origami matemático e computacional do origami moderno dá ênfase), é o aspecto artístico. Como muitos entusiastas do origami, incluindo ocidentais, o já demonstraram, o origami tem um potencial para fazer parte das belas artes. Não apenas na base de uma arte figurativa (representando animais, pessoas, flores, plantas) mas também abstracta (empregando padrões e formas não figurativas).


Referências


  • Beech 2005, Origami, the Complete Guide to the Art of Paperfolding, Rick Beech, Lorenz Books 2005.

  • Boursin 2000, Advanced Origami, more than 60 Fascinating and Challenging Projects for the Serious Folder, Didier Boursin, Firefly Books Ltd., 2000.

  • Cantz 2005, Masters of Origami at Hangar-7, the Art of paper Folding, Hatje CantzVerlag, 2005.

  • Eagle 2006, The Complete Guide to Origami & Papercraft, Eagle Editions 2006.

  • Gött 1991, Aviões de Papel, Till Gött, Plátano Edições Técnicas,1991.

  • Jackson 1999, Origami, a Complete Step-by-Step Guide, Paul Jackson, Chancellor Press, 1999.

  • LaFosse 2005, Advanced Origami, an Artist’s Guide to Perfomances in Paper, Michael G. LaFosse, Tuttle Publishing, 2005.

  • Lang 1988, The Complete Book of Origami, Step-by-Step Instructions in over 1000 Diagrams, 37 Original Models, Dover Publications, Inc., 1988.

  • Lang 2003, Origami Design Secrets, Mathematical Methods for an Ancient Art, Robert J. Lang, A K Peters Ltd., 2003.

  • Mitchell 2001, Origami Matemáticos, David Mitchell, Editora Replicação, 2001.

  • Nacional 2005, A Arte de Dobrar Papel, Origami, Aviões, Barcos, Helicópteros, Animais, Caixas, Adornos, Flores, Figuras que Funcionam com Movimento, Editora Educação Nacional, 2005.

  • Pappas 1998, Fascínios da Matemática, a Descoberta da Matemática que nos Rodeia, Theoni Pappas, Editora Replicação, 1998.

  • Pepin 2002a, How to Fold, Pepin Press/Agile Rabbit Editions, 2002.

  • Pepin 2002b, Foldind Patterns for Display & Publicity, Pepin Press/Agile Rabbit Editions, 2002.

  • Pepin 2003, Structural Package Designs, Pepin Press/Agile Rabbit Editions, 2003.

  • Robinson 2004, Adult Origami, Nick Robinson, New Holland Publishers, 2004.

  • Robinson 2006, Enciclopédia do Origami, Guia Completo e Totalmente Ilustrado da Arte da Dobragem do Papel, Nick Robinson, Dinalivro, 2006.

  • Rocha 2000, Plasticidade do Papel e Design, Carlos Sousa Rocha, PLátano Editora, 2000.

  • Schelle 1987, The Great Origami Book, Zülal Aytüre-Schelle, Sterling Publishing Co., Inc., 1987.

  • Temko 2006, Origami and Kirigami, 75 Fun-to-Do Projects, Florence Temko, Dover Publications, Inc., 2006.


댓글

별점 5점 중 0점을 주었습니다.
등록된 평점 없음

평점 추가

© 2024 por Nuno Cesário

bottom of page